sexta-feira, 29 de março de 2013

Namoro

Há alguns anos entrei em contato com esse poema. O autor angolano, Viriato da Cruz, continua desconhecido, pelo menos para mim, mas o poema é lindo... dedico para aqueles que um dia viveram a espera de um SIM...


"Namoro
Mandei-lhe uma carta em papel perfumado
e com letra bonita eu disse ela tinha
um sorrir luminoso tão quente e gaiato
como o sol de Novembro brincando
de artista nas acácias floridas
espalhando diamantes na fímbria do mar
e dando calor ao sumo das mangas

Sua pele macia - era sumaúma...
Sua pele macia, da cor do jambo, cheirando a rosas
sua pele macia guardava as doçuras do corpo rijo
tão rijo e tão doce - como o maboque...
Seus seios, laranjas - laranjas do Loje
seus dentes... - marfim...
Mandei-lhe essa carta
e ela disse que não.

Mandei-lhe um cartão
que o amigo Maninho tipografou:
"Por ti sofre o meu coração"
Num canto - SIM, noutro canto - NÃO
E ela o canto do NÃO dobrou

Mandei-lhe um recado pela Zefa do Sete
pedindo, rogando de joelhos no chão
pela Senhora do Cabo, pela Santa Ifigenia,
me desse a ventura do seu namoro...
E ela disse que não.

Levei á Avo Chica, quimbanda de fama
a areia da marca que o seu pé deixou
para que fizesse um feitiço forte e seguro
que nela nascesse um amor como o meu...
E o feitiço falhou.

Esperei-a de tarde, á porta da fabrica,
ofertei-lhe um colar e um anel e um broche,
paguei-lhe doces na calçada da Missão,
ficamos num banco do largo da Estátua,
afaguei-lhe as mãos...
falei-lhe de amor... e ela disse que não.

Andei barbudo, sujo e descalço,
como um mona-ngamba.
Procuraram por mim
"-Não viu...(ai, não viu...?) não viu Benjamim?"
E perdido me deram no morro da Samba.

Para me distrair
levaram-me ao baile do Sô Januario
mas ela lá estava num canto a rir
contando o meu caso
as moças mais lindas do Bairro Operário.

Tocaram uma rumba - dancei com ela
e num passo maluco voamos na sala
qual uma estrela riscando o céu!
E a malta gritou: "Aí Benjamim !"
Olhei-a nos olhos - sorriu para mim
pedi-lhe um beijo - e ela disse que sim. "

sábado, 10 de março de 2012

OS DOIS LADOS

Deste lado tem meu corpo
tem o sonho
tem a minha namorada na janela
tem as ruas gritando de luzes e movimentos
tem meu amor tão lento
tem o mundo batendo na minha memória
tem o caminho pro trabalho

Do outro lado tem outras vidas vivendo da minha vida
tem pensamentos sérios me esperando na sala de visitas
tem minha noiva definitiva me esperando com flores na mão,
tem a morte, as colunas da ordem e da desordem.

MENDES, Murilo. Poemas e Bumba-meu-poeta. Rio de Janeiro: Nova Fronteira

domingo, 6 de novembro de 2011

Definição: literatura é...



Sentimos uma necessidade imensa de definir, conceituar as coisas e pessoas. Precisamos definir as opções sexuais, os astros, as letras e
tudo que existe, inclusive Deus que, sabiamente, se definiu como aquele que é. Perece que isso é tão essencial quanto respirar. Mas o que não sabemos é que as definições esvaziam o sentido principal das coisas e pessoas. Não percebemos que as definições são tão exatas e as exceções não cabem nelas. As definições só servem para enquadrar um ponto de vista que se apresenta como único e verdadeiro.
Portanto, definir é esvaziar...
A necessidade de produção de conhecimento colabora muito para
a criação de conceitos. Pesquisas científicas, vivências religiosas ou
conhecimentos populares enquadram o mundo em definições. Vemos a partir de
outros olhares. Nem sempre nitidamente, mas vemos. Partindo desses
pressupostos, questões intrigantes se apresentam: é possível definir o que é arte? É possível conceituar a literatura?...

Acredito que isso é impossível... Mas como necessidade vital me
atrevo a definir esse mundo metafórico das palavras: literatura é... a arte do
não dito! Podem me chamar de insano, ou melhor, de louco mesmo. Pois, como uma
arte que modela palavras pode não dizer nada? Explico-me: Antônio Cândido
afirma que a maioria dos autores brasileiros é mais tático do que estrategista. Isso quer dizer que eles são movidos mais pela inspiração, pelo instinto, pelo pensamento, pela sensibilidade e subjetividade....do que pelo meios técnicos ou parnasianos, movimento fracassado na nossa literatura. Portanto, se nossos autores são tão subjetivos é impossível apresentar uma única versão, interpretação das suas
obras. É impossível invadir o pensamento do autor para saber o que ele quer, metaforicamente, dizer. A partir disso, surge a arte literária brasileira. Os vários sentidos que podemos extrair das obras brasileiras condiz com minha definição: literatura é a arte do não dito...

Alguém se atreve a dizer que minha definição é vazia?


terça-feira, 31 de maio de 2011

Encanto, coisa que delicia...


"Mas eu olhava esse menino, com um prazer de companhia, como nunca por ninguém eu não tinha sentido. Achava que ele era muito diferente, gostei daquelas finas feições, a voz mesma, muito leve, muito aprazível. Porque ele falava sem mudança, nem intenção, sem sobêjo de esforço, fazia de conversar uma conversa adulta e antiga. Fui recebendo em mim o desejo de ele não fosse mais embora, mas ficasse, sobre as horas, e assim como estava sendo, sem parolagem miúda, sem brincadeira – só meu companheiro amigo desconhecido” Riobaldo
O encanto acontece até mesmo em situações simples....dessas como uma conversa, uma apresentação ou um papo despretensioso....depois as dobras do encanto se desdobram numa afinidade, num encontro, na balada, no calor dos corpos mesmo sem se tocarem. O beijo então como união de calores num dia de frio. De repente, duas almas formam um amor. Almas que se juntam e se fecundam num só coração.
O encanto é inexplicavelmente uma surpresa... e isso é o melhor. Afinal, surpresas são sempre boas e importantes. Não é a toa que Deus virá como um ladrão, sem hora nem dia marcado, de surpresa. Também é de surpresa que a morte nos pega, mesmo quando já a esperamos. Mas a morte é boa? Talvez a morte seja a única surpresa não boa, mas ela é superável, pois é com tal surpresa que o amor é mais forte que a morte.
Não há vida sem encanto, sem feitiço...como não há vida sem amor, esperança. Por isso, cada um se enfeitiça de algo, de alguém... é como se fosse uma ordem natural! Todos sentimos essa necessidade! Uns se deixam seduzir por coisas simples, outros por sonhos irrealizáveis, mas com realidade ou sonho, o encanto é fundamental e...
o amor necessita de encanto...

terça-feira, 12 de outubro de 2010

O MELHOR DE “SE”

Se todas as preocupações fossem despreocupadas
Se todos os sentimentos, intensos
Se as pessoas, sinceras
O mundo seria melhor, menos denso.

O melhor é hipótese
Que o "se" explica
Ou complica!
Afinal, é suposição!



domingo, 16 de maio de 2010

Com que moral?

Peço licença nesse espaço literário para comentar uma declaração inesperada de um religioso. Li, recentemente, que na Assembleia Geral da CNBB, dom Dadeus, arcebispo de Porto Alegre, fez a seguinte declaração: “Antigamente, não se falava em homossexual. E era discriminado. Quando se começa a dizer que eles têm direitos, direitos de se manifestar publicamente, daqui a pouco vão achar os direitos dos pedófilos”. Uma afirmação infeliz e ignorante.

Em parte o arcebispo está certo. Digo em parte porque direitos de se manifestar publicamente todos as pessoas têm. Afinal isso é garantido pela Constituição Federal que apresenta direitos de liberdade de manifestação do pensamento, da criação, da expressão e da informação. Incluo nesse assunto, para ilustrar, uma manifestação inédita que presenciei no sábado passado em Belo Horizonte. Um grupo de manifestantes subia a Afonso Pena cantando: “Eu sou maconheiro com muito orgulho, com muito amor”. Era uma manifestação para a legalização da maconha, devidamente organizada e com proteção policial. Isso é importante lembrar. Eles estavam exercendo o direito da manifestação pública.

Por outro lado, o bispo ao dizer que “antigamente não se falava em homossexual” está cometendo um grande erro, pois o homossexualismo é uma prática demasiadamente relatada na literatura e na história. Safo, maior poetisa lírica da Antigüidade e reconhecida até por Platão, já manifestava o sentimento homossexual pela sua aluna Átis. Isso antes de Cristo. Posso afirmar que esse homossexualismo é noutro contexto, mas não deixa de ser uma manifestação dos sentimentos, afinal os poemas de Safo relatam esse amor proibido e impossível por Átis. Talvez a antiguidade do bispo seja outra.

O que mais incomoda na manifestação do religioso é a comparação entre os direitos conquistados pelos homossexuais com os pedófilos. Isso demonstra outra grande ignorância de um bispo que pode ser considerado um sujeito estudado e que apresenta autoridade. Ignorância porque ele iguala um grupo consciente e que defende a diversidade com outro grupo de pessoas doentes e permissivas. Talvez o bispo esteja preocupado em se defender, afinal os escândalos atuais de pedofilia no Brasil e no mundo envolvem a Igreja. Isso fica claro porque na mesma 48° Assembleia da CNBB ele manifesta seu posicionamento: “A Igreja ir lá e acusar seus próprios filhos seria um pouco estranho”. Dom Dadeus parece um pouco desesperado e perdido nos acontecimentos atuais e históricos.

Enfim, o posicionamento do arcebispo é o mesmo que o da Igreja na Idade Média a qual por volta do século XI queimou toda a obra de Safo. Obra reunida pelos Alexandrinos e que graças a pesquisas no século XIX de arqueólogos britânicos descobriram cerca de seiscentos versos, o bastante para considerá-la como a maior poetisa lírica da Antigüidade. Acredito que dentro desse contexto dom Dadeus deveria falar o que pensa e defender a moral cristã, mas pensar como fala é importante para que a Igreja continue a defender o direito de todos à igualdade. Portanto homossexualismo é coisa antiga que só o bispo não ouviu falar e por isso faz comparações indevidas, mesmo sem moral para isso.

domingo, 2 de maio de 2010

Poeta, poetinha camarada...

As obras de Vinicus de Moraes estão disponiveis na Brasiliana Digital (USP). O internauta tem acesso irrestrito a um acervo de livros, periódicos e manuscritos de autores diversos. O acervo é composto por obras da USP e do grande José Mindlin. Livros digitais com edições, às vezes, inéditas.


A obra do Vinicis de Moraes, desde seu primeiro livro em 1933, já está disponivel. Acesse e conheça mais a obra desse grande dramatrugo, poeta e músico da nossa modernidade.